Como é ser chamado para uma missão? Entenda isso através do chamado de Eliseu
Texto dentro do contexto
fonte: Guiame, Cris Beloni
Atualizado: Segunda-feira, 2 Agosto de 2021 as 3:16
“E Eliseu voltou, apanhou a sua parelha de bois e os matou. Queimou o equipamento de arar para cozinhar a carne e a deu ao povo, e eles comeram. Depois partiu com Elias, e se tornou o seu auxiliar.” (1 Reis 19.21)
Vamos ao contexto
Em nosso texto de estudo, vimos o início do ministério de Eliseu. O contexto é o seguinte: há mais de 2.800 anos, Eliseu viveu num tempo de grande crise social, política e econômica.
Israel e Síria estavam em guerra. Segundo o teólogo e escritor Hernandes Dias Lopes, o profeta viu uma das mais amargas crises de fome da humanidade. No capítulo 18, lemos que o povo também enfrentava a seca, além disso, se destacou a apostasia.
Havia centenas de profetas de Baal e de outros deuses naquela terra. Os profetas de Deus foram perseguidos durante o reinado de Acabe. Elias, o único que restou deles, foi chamado de “perturbador de Israel”.
No entanto, ele foi firme, desafiou os falsos profetas e todos foram mortos. Quando Jezabel soube disso, ameaçou matar Elias. Mais tarde, ele teve uma crise de depressão. Provavelmente, por causa dos problemas enfrentados, o desgaste físico e espiritual, e por se sentir sozinho.
Durante uma conversa com Deus, foi revelado a ele que ainda havia 7 mil pessoas em Israel que não tinham se dobrado a Baal. O Senhor mandou que ele retornasse pelo mesmo caminho e que ungisse Eliseu como profeta.
“Então Elias saiu de lá e encontrou Eliseu, filho de Safate. Ele estava arando com doze parelhas de bois, e estava conduzindo a décima-segunda parelha. Elias o alcançou e lançou a sua capa sobre ele.” (1 Reis 19.19)
Até aqui, vimos o que aconteceu antes do chamado de Eliseu. Agora vamos analisar os detalhes.
Quem foi Eliseu?
Um homem santo em seu proceder, conforme a Bíblia. Teve um ministério que durou mais de 50 anos, começando durante o reinado de Acabe até o rei Joás. Como substituto de Elias, foi bastante popular e se envolveu tanto com as questões políticas daquela época quanto com os problemas do povo.
Eliseu liderou o que parecia ser uma “escola de profetas”. Havia discípulos que acompanhavam a dupla Elias e Eliseu. Só na ocasião da partida de Elias, havia 50 deles assistindo tudo. Mas eles não tinham o discernimento e a maturidade espiritual de Eliseu, pois mesmo estando presentes na hora do arrebatamento, eles se ofereceram para fazer uma busca pelas redondezas, durante três dias, para ver se encontravam Elias.
A capa lançada sobre Eliseu
A capa ou manto era usado sobre a túnica como forma de proteção, contra o frio e o calor. Nesse caso, era feito com a lã de carneiros ou pêlos de outros animais. Mas a capa também podia ser feita de seda e, nesse caso, era usada para reconhecimento público de uma pessoa importante na sociedade, como faziam os fariseus. Possivelmente, a capa de Elias era usada para protegê-lo durante suas caminhadas e não para exibir seus dons proféticos.
Quando ele lançou sua capa sobre Eliseu, foi uma ação espontânea. O teólogo e hebraísta, Luiz Sayão, explica que não havia nenhum “ritual” anterior que ele estivesse repetindo. Aliás, o professor alerta para a necessidade de reconhecer que em cada tempo bíblico, havia um agir específico por parte dos profetas.
Mas existe uma ligação simbólica que pode ser considerada nesse texto, lembrou Sayão. Cobrir uma criança com um manto significava, entre os hebreus, que ela estava sendo adotada. Então, simbolicamente, Eliseu se tornou filho de Elias, no sentido profético, ou seja, um seguidor pleno. Segue um texto que confirma isso:
“Eliseu gritou: Meu pai! Meu pai! Tu eras como os carros de guerra e os cavaleiros de Israel! E quando já não podia mais vê-lo, Eliseu pegou as próprias vestes e as rasgou ao meio. Depois pegou o manto de Elias, que tinha caído, e voltou para a margem do Jordão. (2 Reis 2.12-13)
Porção dobrada
“Elias disse a Eliseu: O que posso fazer por você antes que eu seja levado para longe de você? Respondeu Eliseu: Faze de mim o principal herdeiro de teu espírito profético.” (2 Reis 2.9)
Esse pedido foi baseado na própria lei de herança daquela época, quando o filho mais velho recebia porção dobrada da herança do pai. Eliseu estava reivindicando, naquela ocasião, uma herança espiritual.
Trabalho no campo
De acordo com Christie Chadwick, doutora em Arqueologia Bíblica e historiadora pela USP, os campos de trabalho ficavam ao redor das vilas. “Não era como nos dias atuais, que o campo fica ao redor da casa. Existia uma vila, com todas as casas e, ao redor da vila, um campo enorme que era distribuído por porções para aqueles moradores. Cada família sabia onde ficava a sua terra”, ela explica. Quando Elias encontrou Eliseu, ele estava fora da vila, trabalhando.
O trabalho na agricultura era difícil porque as chuvas não eram contínuas, logo, a alimentação naqueles tempos era bem restrita, ainda mais em tempos de guerra. O arado utilizado naquelas regiões era um instrumento simples. Basicamente, feito com pedaços de madeira, unidos em forma de “T” e depois amarrado ao jugo.
Jugo feito de madeira, utilizado para unir dois bois, para que andem no mesmo compasso enquanto puxam um arado ou uma carroça; também conhecido por canga ou junta de bois. (Foto: Canva)
Assista:
O jugo – era simplesmente um pedaço de madeira colocado sobre o pescoço de um par de animais e amarrado por baixo.
Algumas versões bíblicas se referem ao equipamento do arado que Eliseu queimou como “aparelhos dos bois” (Revista e Corrigida) ou “madeira da canga” (NTLH). Algumas pessoas chamam de “carroça”, mas não é uma descrição ideal, porque a carroça é utilizada como meio de transporte de pessoas ou de cargas. O arado é utilizado somente como uma ferramenta no campo.
Parelha de bois, unidos pelo jugo. (Imagem: Canva)
Eliseu provavelmente era um agricultor vindo de família próspera, já que possuía 12 parelhas ou 24 bois, que trabalhavam em conjunto com os equipamentos de arar. Quando ele foi encontrado por Elias, estava conduzindo a última parelha, possivelmente no final das atividades do dia.
Sendo um trabalho pesado e braçal, podemos imaginar que Eliseu estava bem cansado. E o que isso nos revela? Que Deus estava chamando um homem bastante ocupado e comprometido com suas responsabilidades. Então, o excesso de trabalho não pode ser uma desculpa para nos desviarmos da missão que Deus preparou para cada um de nós. Na Bíblia, vemos que Deus sempre chama os trabalhadores, aqueles que estão ocupados.
Eliseu se despede de seus pais
Existe um aspecto muito importante a ser analisado aqui. A despedida aos pais não significa desfazer os laços familiares de amor e de respeito, mas desapegar de tradições ou ocupações diárias da família para investir mais tempo em sua missão.
Enquanto muitos colocam a família na frente de tudo, Eliseu a deixou para priorizar Deus em sua vida. Há mais exemplos na Bíblia sobre essa atitude – como Abraão que deixou a sua terra, os seus parentes e a casa de seu pai por obediência a Deus. (Gênesis 12.1)
Tanto Eliseu quanto Abraão aceitaram seu ministério e a vontade de Deus para suas vidas. Eles continuaram amando e honrando seus pais, mas colocaram Deus em primeiro lugar.
Eliseu matou seus bois
Naquela época, o gado bovino era utilizado somente para o trabalho na agricultura. A Dra. Chadwick explica que não havia interesse na comercialização da carne dos animais.
“Temos evidências arqueológicas disso”, reforçou. Então, quando Eliseu decidiu matar todos os bois, primeiro ele se mostrou decidido a abandonar seu trabalho para aceitar seu ministério e, segundo, o texto diz que ele ofereceu a carne ao povo, o que parece ser uma oferta de agradecimento e uma festa de comemoração.
Em nosso tempo, chamaríamos isso de culto de ação de graças seguido de uma boa churrascada. Em nenhum momento, lemos na Bíblia que Eliseu estava triste ou com receio de abandonar tudo para seguir Elias.
Eliseu queimou seus equipamentos de arar
O arado era a ferramenta de trabalho de Eliseu. Conforme a Bíblia, vimos que o profeta queimou todo o equipamento de madeira para preparar a carne para o povo comer. Agindo assim, ele estava eliminando qualquer possibilidade de voltar à velha vida.
A decisão dele foi única e ele deixou claro que não olharia para trás. Diferente de Pedro e alguns discípulos que decidiram voltar a pescar depois da morte física de Jesus. O retorno foi possível porque o barco ainda estava lá. Mas, no caso de Eliseu, se decidisse voltar atrás, não encontraria mais o seu arado, nem os seus bois.
Eliseu partiu com Elias
Não há muitos detalhes sobre o treinamento de Eliseu como profeta, mas a Bíblia deixa claro que ele não largava Elias por nada. Sempre que o profeta mais velho dizia que iria aqui ou ali, Eliseu respondia:
“Juro pelo nome do Senhor e por tua vida, que não te deixarei ir só.” (2 Reis 2.6)
Vale lembrar que Eliseu foi “ungido por Deus”, ou seja, escolhido e separado para um ministério. Ministério significa trabalho. Deus estava guiando Eliseu, mas ele deveria fazer a sua parte, ou seja, se esforçar tanto no aprendizado quanto no executar de suas novas funções.
Resumindo
Vimos na figura de Eliseu um homem decidido e corajoso. Sua história serve de exemplo até os nossos dias e nos faz refletir sobre “quem somos” e qual é a “nossa missão” nessa terra. Todas as pessoas, no decorrer de suas vidas, são chamadas por Deus para exercer um ministério. Deus tem uma missão para cada um de nós.
Reflita sobre isso — a capa já foi lançada sobre os seus ombros? Se a sua resposta for “sim”, você já se preparou para abandonar a velha vida e seguir um novo tempo com Deus? Lembre-se que antes de todo começo, existe um fim. Você só pode iniciar um novo parágrafo depois de um ponto final.
Se você vive um momento de decisão entre o velho e o novo, saiba que é tempo de despedir-se do que você tem agora. Talvez seja tempo de fazer uma “fogueira simbólica” e queimar aquilo o que te impede de seguir o seu chamado. Deixar a “zona de conforto” pode exigir alguns sacrifícios, mas ao final do caminho, vai valer a pena. Pense nisso!
Para chegar ao destino, é preciso partir. Para nascer, é preciso morrer. Muitas vezes, é preciso abrir mão de tudo o que temos para tomar posse do que Deus preparou para nós. Porque “o Reino dos céus é como um tesouro escondido num campo. Certo homem, tendo-o encontrado, escondeu-o de novo e, então, cheio de alegria, foi, vendeu tudo o que tinha e comprou aquele campo.” (Mateus 13.44)
Por Cris Beloni, jornalista cristã, pesquisadora e escritora. Lidera o Movimento Bíblia Investigada e ajuda as pessoas no entendimento bíblico para a ativação de seus dons. Trabalha com missões transculturais, Igreja Perseguida, teorias científicas, escatologia e análise de textos bíblicos.
* O conteúdo do texto acima é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
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